Olhar de pássaro sobre Nowa Huta, na parte oriental de Cracóvia. A construção da “Nova Siderurgia” iniciou-se nos anos 50 e destinava-se a acolher 100 mil habitantes. O arquiteto Tadeusz Ptaszycki e sua equipa projetaram tudo, desde o traçado urbano até às escadas interiores dos edifícios, com os objetivos de criar espaços de relacionamento amigável e trazer felicidade aos trabalhadores. Décadas mais tarde, a cidade ideológica tornou-se problemática. Nos anos 80, foi palco de contestação ao regime pelo Sindicato Solidariedade. Nos anos 90, foi associada ao crime e à depressão económica. Hoje, recuperou dinamismo com a valorização e proteção do património arquitetónico e a abertura de lojas, cafés e serviços.
Fonte da fotografia: https://en.wikipedia.org/wiki/Nowa_Huta
Uma vendedora de Obwarzanek, um pão em forma de rosca coberto de sal ou
sementes de papoila.
Aleja Solidarność (Avenida Solidariedade). Mais de 2 km em linha reta e
larga, desde a Praça Central até à sede da Siderurgia Tadeusz Sendzimir (ex-Vladimir
Lenin).
Entre a Praça Central e o Park Ratuszowy (Parque da Câmara), a Aleja Róż (Avenida
das Rosas). Ao centro, havia uma estátua gigante de Vladimir Lenin. Entre 1973
e 1989, resistiu a manifestações populares, a atentados à bomba e a atos de
vandalismo. Em 1992, foi comprada por um empresário sueco e exilou-se no Museu
de Curiosidades de Värnamo, nos arredores de Estocolmo.
Bar Mleczny, uma sobrevivente leitaria comunista. Destacam-se os lustres, o
estilo cantina e as fotos dos anos 60/70 de Nowa Huta.
Antigo Cinema Światowid, atualmente Museu Nowa Huta. Interior em renovação.
Apenas está aberta a parte subterrânea, com a exposição "Terror Nuclear: abrigos
em Nowa Huta".
O percurso é uma viagem ao tempo da Guerra Fria. Perante a ameaça nuclear, a
cidade e a população estavam em alerta. Havia 250 abrigos subterrâneos e cada
cidadão sabia o que tinha de fazer numa emergência.
Após a 2.ª Guerra Mundial, a Guerra da Coreia (1950-53) foi o primeiro
conflito por procuração entre as duas superpotências. Este acontecimento teve
impacto na construção civil e na vida quotidiana. Em contexto de Guerra Fria, acentuou a necessidade
de construir abrigos e de treinar as populações.
O cogumelo nuclear ladeado por cartazes de propaganda. As autoridades sabiam que era difícil sobreviver a um ataque, mas os equipamentos e os exercícios de proteção eram necessários para transmitir tranquilidade e confiança à população.
De regresso à Avenida Solidariedade. Ao fundo, à direita, uma alteração importante
no padrão arquitetónico…
O Bloco Sueco (1957-59) foi uma introdução modernista possibilitada pelo
desanuviamento político pós Estaline. Alguns arquitetos estudaram na Suécia
novos designs urbanos. Inspirados nas propostas de Le Corbusier, sobressaem varandas e largas sequências de janelas com vista para uma área verde.
Na esquina entre Orkana e Solidarność, uma torre de observação no topo de um
edifício, para reconhecer ameaças e alertar a população.
Complexo Escolar de Educação Mecânica n.º 3. A fachada segue a estética realista, com imponentes linhas neoclássicas. No interior, localiza-se um ramo subterrâneo do Museu Nowa Huta.
Entrada do museu. A exposição “Estado de Emergência” faz uma diagonal sobre
outros abrigos nucleares no mundo e termina com uma instalação contemporânea,
em que são colocadas diversas questões existenciais perante o confinamento.
No interior do Stylowa, um restaurante a espalhar estilo desde 1956. À mesa, design retro e
flores de plástico. Na sala principal, dois comensais em processo de autogestão.
Numa outra ala, um homem tranquilo com um cão maldisposto. No ar, uma
sonoridade country em língua polaca e bedum a fritos em doses nucleares. O charme atmosférico reside
em não dar concessões à modernidade. Portanto, o local ideal para almoçar e concluir
a caminhada por Nowa Huta.
Nas paredes, há fotografias a preto e branco que guardam a memória da inacabada
utopia. Trabalhadores a caminho da siderurgia.
A minha refeição: crepes de espinafres com iogurte natural, acompanhados por uma cerveja Zywiec. Serviço indiferente, mas eficaz. Comunicação reduzida ao mínimo. Um Uber antes do tempo. As únicas palavras que a empregada trocou comigo foram ditas no final, depois de ter aguardado que ela acabasse de fumar um cigarro no exterior: “Card or cash?” Ah… afinal, sempre houve uma fissura da modernidade com a introdução do pagamento eletrónico. Preferi “cash”, para manter-me fiel ao espírito do lugar.
Mais do que uma vitrine, uma fronteira temporal. Não é fácil gostar do Stylowa, mas seria trágico se o lugar fosse remodelado ou fechado.