sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Fajã da Caldeira de Santo Cristo

A Fajã da Caldeira de Santo Cristo localiza-se na costa norte da ilha e teve origem na sequência de um desabamento de terras, resultante do sismo de 9 de julho de 1757. É a mais conhecida de todas as fajãs de S. Jorge, não só pela existência de amêijoas na sua lagoa, mas também pelo seu caráter religioso. No centro da fajã, há uma ermida à qual está associada uma lenda, que relata a aparição de uma imagem do Senhor Santo Cristo nas margens da caldeira.

Até aos anos setenta do século passado, a fajã tinha uma pequena comunidade de mais de cem habitantes. Após o sismo de 1980, foi praticamente abandonada e os seus antigos residentes foram incentivados a não regressar devido à instabilidade das arribas. Ao caminhar pelo trilho, podemos encontrar muitas casas abandonadas pertencentes a um tempo que chegou ao fim. Em agosto, a fajã recupera alguma animação com a chegada de um pequeno número de emigrantes ou turistas. No final do estio, fica novamente entregue à meia dúzia de habitantes permanentes.

Chega-se calmamente a pé, em 40 minutos, por um caminho plano junto à costa, desde a Fajã dos Cubres ou com um pouco de esforço, num par de horas, descendo 5 km desde a Serra do Topo. Preferi a segunda opção, pelo suplemento de beleza. Como escreveu o ex-jornalista do Público, Nuno Ferreira, “A Fajã da Caldeira de Santo Cristo é um lugar fora deste mundo. Talvez por não ter ainda eletricidade (nem água canalizada, telefones fixos e asfalto, acrescento). Talvez por morar lá pouca gente. Talvez pela atmosfera criada pela montanha em redor, pelo dançar constante das nuvens, pela tranquilidade da lagoa e o rumor do mar ali em frente.” A minha passagem pela fajã foi das experiências mais emotivas que vivi no arquipélago, semelhantes à subida da montanha do Pico ou à longa caminhada pela costa ocidental das Flores. Uma visita à Fajã da Caldeira de Santo Cristo vale uma viagem ou um regresso a S. Jorge.

Uma nota final: a circulação de motos quatro, condicionada a determinados horários, pelo caminho costeiro, entre a Fajã dos Cubres e a Fajã da Caldeira de Santo Cristo, divide opiniões, mas não altera nada do que foi escrito anteriormente.

Início do trilho. Há um ditado açoriano que diz que num dia confluem todas as estações do ano. Eu tenho outra versão, na minha opinião, mais ajustada com a realidade. Deixaria o inverno de lado, uma vez que não há frio, e diria que, nos Açores, podemos encontrar, no mesmo dia, variadíssimas combinações de outono, primavera e verão. Por exemplo, quando fui à Fajã da Caldeira de Santo Cristo, saí a pé, do casulo abafado, húmido e quente da Calheta, debaixo de um céu de chumbo. Uma típica manhã de “torpor açoriano”, de “mormaço”, como lhe chamou Vitorino Nemésio. No parque eólico, em plena serra, enfrentei a bruma na cara e a chuva fresca na cabeça que me fizeram hesitar em relação à continuação da caminhada… “Que faço eu aqui molhado e sem ver nada à minha frente?..” Por fim, quando cheguei ao início do trilho, na costa norte, vi o Sol e um horizonte mais animador que me acompanharam até à Fajã dos Cubres.

Descida da serra por uma vereda ladeada de hortênsias ou hidrângeas.

No caminho para a Fajã I. Vista do vale profundamente cavado, numa sucessão de lombas e ravinas, revestidas de matos de montanha. Todo o trilho é um miradouro.

 No caminho para a Fajã II.

 No caminho para a Fajã III.

Primeira visão da Fajã da Caldeira de Santo Cristo.

Chegada.

Laclinh, um simpático companheiro dos poucos habitantes permanentes da fajã.

Ermida do Senhor do Santo Cristo, de 1835, com romaria no primeiro Domingo de setembro, altura em que muitos devotos se deslocam à fajã. O fim da festa religiosa marca o regresso à tranquilidade secular.

 Lagoa I. A paisagem envolvente, a existência de amêijoas e a possibilidade de mergulho nas águas tépidas e transparentes fazem da lagoa a principal atração da fajã.
 
Lagoa II.

Lagoa III.

Lagoa IV.

Na fajã, há um pequeno café/restaurante, O Borges, que está aberto durante os meses de verão e nalguns fins de semana no inverno. A refrigeração é alimentada por geradores. Quando por lá passei, havia apenas três homens no terraço exterior que tratavam com umas minis a desidratação que uma boa conversa provoca… Eu fiquei ao balcão a dar duas de treta com o dono e a cuidar da minha saúde...

Mercearia abandonada.